Cabotagem: chegou a hora de trocar o modal rodoviário?
Análise das vantagens e desvantagens do transporte por cabotagem frente ao rodoviário
Sabe-se que o modal rodoviário está enfrentando diversos problemas no território brasileiro e há necessidade de explorar alternativas viáveis. De fato, o modal rodoviário enfrenta diversas desvantagens para longas distâncias como custo do frete, pouco volume transportado, trânsito, roubos e furtos, acidentes e malha em constante manutenção. Assim, o aperfeiçoamento de outros modais de transporte tornou-se o foco da logística. A cabotagem tem sido destacada como uma abordagem que aproveita o modal hidroviário e todas as suas vantagens no transporte de grandes volumes com baixos preços de frete.
O que é cabotagem
A cabotagem faz parte do transporte aquaviário e consiste no transporte de cargas sem perder a costa de vista e por isso se contrapõe a navegação de longo curso, que é realizada entre portos de diferentes nações se afastando da costa.
A cabotagem pode ser separada em cabotagem doméstica e internacional. A cabotagem internacional pode ser exemplificada como o transporte de mercadoria entre portos de dois ou três países vizinhos, tais como: Brasil, Uruguai e Argentina desde que não perder a costa de vista. No caso da cabotagem doméstica, todo o deslocamento fica restrito aos portos do mesmo país, o que simplifica a operacionalização, por não precisar lidar com exigências distintas na legislação de cada país. Para alguns autores e órgãos governamentais a cabotagem pode incluir também a movimentação de cargas por navegação feita em rios e lagos do mesmo país, que também pode ser considera uma modalidade específica do transporte aquaviário (ou hidroviário), denominada navegação de interior. De forma geral, a atividade mais costumeira é realizada apenas dentro do território brasileiro ligando os portos nacionais, enquanto o marítimo é a navegação entre portos internacionais.
Pelas suas características, o uso da cabotagem é normalmente parte de uma operação que envolve outros modais, que fazem a conexão entre os portos e as instalações de origem ou destino. De forma geral, a cabotagem inicia com o transporte de cargas rodoviários feito por operadores logísticos ou transportadoras que coletam a carga no ponto de origem e a levam até o porto de partida. No porto, a carga é embarcada no navio para o deslocamento pela costa até a descarga do navio no porto de destino, onde ocorre o translado da carga para do veículo rodoviário que segue para o destino final. Eventualmente, vagões ferroviários podem ser usados em substituição ao transporte rodoviário, sobretudo para minérios e grãos, mas esta é uma combinação bem menos frequente, pois depende da alta capilaridade da malha ferroviária e da existência plataformas intermodais com portos e ferrovias.
Contexto da Cabotagem no Brasil
No contexto moderno brasileiro, após a abertura de rodoviárias que passaram a conectar o território brasileiro, a cabotagem a perdeu muito espaço como modalidade de transportes o que colaborou para uma limitada oferta de fornecedores de serviço e para baixa frequência nas rotas de transporte. Apesar deste fato, há que se estimular o uso deste modal por parte dos governos e também cabe aos profissionais de logística a busca pelo maior uso da cabotagem dadas as importantes vantagens da mesma e sua aplicabilidade no contexto brasileiro.
Deve-se ressaltar que o Brasil possui um território propício ao uso da cabotagem graças aos cerca de 7.400 Km de costa navegável que o país possui. Outro ponto importante, que favorece este modal, consiste no fato de que mais de 70% da população reside em áreas litorâneas; resultando numa concentração do mercado consumidor e das atividades econômicas em áreas que podem ser servidas por portos e terminais de cargas, elos essenciais da malha de transporte por cabotagem.
Segundo o Anuário 2020 da CNT (Confederação Nacional de Transporte de Cargas) 240,9 milhões de toneladas de carga foram movimentadas em 2019 via cabotagem; um aumento de 4,1% em relação a 2018 (231,4 milhões). Apesar disso, o potencial de crescimento ainda é muito grande, basta registrar que em 2019, o Brasil movimentou 61% de suas cargas através das rodovias, considerando os TKUs (tonelada-quilômetro útil) movimentados. No mesmo período, 21% das cargas seguiram pelo modal ferroviário, 12% por cabotagem, 4% por dutos, 2% por hidrovias e menos de 1% pelo modal aéreo (ALVARENGA, 2020).
Na edição de dezembro de 2019 da publicação Transporte em Números da ANTAQ, com dados da CNT de 2015 até 2019 (parcial até setembro) pode-se identificar os tipos de cargas mais movimentados através da cabotagem, evidenciando o perfil de cargas de menor valor agregado. Os granéis líquidos e gasosos ainda correspondem a mais de 74,0% do total transportado, sendo seguidos pelos granéis líquidos que totalizaram em 2019 11,4%. Observa-se que tanto as cargas conteinerizadas, quanto o transporte de carga geral vem crescendo, com variações de 6,9% para 9,3% e 3,3% para 4,7%, respectivamente; contribuindo para o aumento da diversificação do material transportado. Em termos absolutos, a cabotagem de contêineres tem experimentado uma média de crescimento no volume transportado de 12,5% ao ano (ALVARENGA, 2020), mas seu potencial é muito maior considerando o volume de cargas transportadas a longa distância pelo modal rodoviário.
Vantagens e Desvantagens
Vamos conhecer agora as principais vantagens da cabotagem, especialmente e comparada ao modal rodoviário, campeão na preferência nacional, quando e fala em transporte de carga:
Custo mais baixos
Na análise de frete tem-se uma grande oportunidade para trechos longos com reduções de 10% a 30% em relação ao transporte rodoviário, ou seja, há redução de custo de transporte. Segundo INFRA (2019), uma tonelada de produtos transportada de Belém (PA) para São Paulo (SP) custa, no modal rodoviário, R$ 596 enquanto por cabotagem o mesmo trecho sairá por R$ 325. Outro motivo para redução dos custos é que os navios de cabotagem permitem transportar grandes volumes em um único embarque principalmente para escoar cargas em granel.
Meio ambiente
A cabotagem é o meio de transporte, considerando os padrões tecnológicos vigentes, com menor emissão de dióxido de carbono (CO2). Quando comparada com o modal rodoviário a cabotagem emite entre 10 a 40 gramas de CO2 por quilômetro de carga transportada, frente a uma emissão que varia de 60 a 150 gramas de CO2 por quilômetro de carga transportada dos caminhões. Este fato está relacionado ao menor consumo de combustível por tonelada transportada, que contribui diretamente em uma redução do uso de combustível comparado aos demais modais auxiliando a medidas ambientais do país. Segundo EPL (2015), dos 107,5 milhões de toneladas de CO2 emitidos pelo transporte brasileiro, 86% são derivados do modal rodoviário e apenas 5% da cabotagem. Desta forma, para empresas que queiram assumir compromissos reais com o meio ambiente, o aumento do uso da cabotagem no transporte de seus produtos é um caminho a ser trilhado.
Segurança no transporte
Há menos incidência de roubo, furto e/ou perda de cargas considerado a outros modais populares no brasil, reduzindo as despesas diretas e indiretas decorrentes.
Nova legislação
A legislação brasileira de cabotagem, Lei 4199/20 no dia 08/12/2020, facilita o uso da cabotagem pois é um incentivo a entrada de navios estrangeiros para essa prática. O objetivo é aumentar a oferta de número de embarcações e assim reduzir os custos do setor. Até o momento da lei, apenas empresas brasileiras possuem autorização da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ).
Por outro lado, deve-se reconhecer que existem limitações na aplicação da cabotagem e que a melhor solução logística tende a ser uma combinação de modais, conforme as variáveis da carga e do mercado. Antecipadamente vale destacar que, economicamente, em percursos inferiores a mil quilômetros, tornar-se inviável o uso da cabotagem, sendo preferível uso do modal rodoviário por seus custos e flexibilidade. Assim, as desvantagens são:
Demora de liberação de carga
Na cabotagem ainda há um problema muito comum do brasileiro: burocracia do setor. Há a demora para reconhecer documento pela Receita Federal e a falta de documento único atrapalha a expansão do setor.
Preenchimento da carga mínima transportada
Há necessidade de preencher uma taxa mínima de carga transportada para o barco sair do porto. O que pode levar a um tempo de espera elevado ou até a dificuldade de um pequeno empresário de utilizar este modal.
Necessidade de um planejamento do estoque mais elaborado
A movimentação pela cabotagem sempre possui como característica os grandes volumes de uma única vez acarreta a necessidade de boa organização para não faltar produto durante o processo de cabotagem. Como as quantidades transportadas são maiores e com menos frequência que o modal rodoviário, pode haver momentos de superlotação ou baixa lotação nos armazéns. Além disso, como o transit-time é maior, o estoque em trânsito aumenta e tende a haver um aumento no nível geral dos estoques. Essa oscilação deve ser estudada para ver se há viabilidade na sua operação.
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Comparando transporte Rodoviário e transporte por Cabotagem
Na tabela 01 abaixo é possível observar uma comparação entre os modais rodoviário e cabotagem, considerando as seguintes variáveis de análise: volume transportado, custo de frete por peso ou volume, complexidade burocrática, quantidade mínima de carga e nível de ocorrência de furtos e perdas de mercadoria.
Tabela 01 - Comparação entre modal rodoviário e modal cabotagem
Fonte: EXCENT Consultoria
Considerações finais
Percebe-se que a cabotagem é uma ótima opção de transporte a longas distâncias e com grande aplicabilidade às características geográficas do Brasil, tendo grande potencial de avançar sobre a base de transportes rodoviários realizados acima de 1.000 Km. Neste campo enquadram-se transferências entre armazéns e entre fábricas e armazéns da mesma empresa ou de empresas diferentes. Devido às suas características a cabotagem tende a estar associada com outros modais, quase sempre o rodoviário, que vai realizar os trechos entre as plantas operacionais e os portos.
Apesar das limitações em termos de número, frequência e tempo de viagem, se você é responsável por transporte de grandes volumes pelo litoral brasileiro está na hora de investir em cabotagem e realizar seu planejamento com vários modais de transportes.
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Referências
ALVARENGA, Henrique. Matriz de transportes do Brasil à espera dos investimentos. ILOS – Instituto de Logística e Supply Chain, 2020. Disponível em: https://www.ilos.com.br/web/tag/matriz-de-transportes/. Acesso em: 21/07/2021.
BRASIL. NOTA TÉCNICA Nº 10/2020/CGNV/DNHI-SNPTA/SNPTA. 2020. Disponível em: https://www.gov.br/infraestrutura/pt-br/imagens/2020/09/NotaTcnicaBRdoMar.pdf. Acesso em: 20 de maio de 2021.
CNT (Confederação Nacional de Transporte de Cargas). - Transporte em Números, 2019. Disponível em: https://cdn.cnt.org.br/diretorioVirtualPrd/39b6d11e-7996-4c2b-8894-6cf4e927f1cc.pdf. Acesso em: 22de maio de 2021.
CNT (Confederação Nacional de Transporte de Cargas). - Anuário CNT do Transporte - Estatísticas Consolidadas 2020, 2020. Disponível em: https://anuariodotransporte.cnt.org.br/2020/. Acesso em: 23/07/2021.
ELOS. Transporte de carga panorama brasil. 2015. Disponivel em: https://www.epl.gov.br/transporte-inter-regional-de-carga-no-brasil-panorama-2015. Acesso em: 20 de maio de 2021.
INFRA(org.). Cabotagem: caminho mais barato da carga bloqueado por burocracia, cartel e falta de planejamento. 2019. Disponível em: https://www.agenciainfra.com/blog/cabotagem-caminho-mais-barato-da-carga-bloqueado-por-burocracia-cartel-e-falta-de-planejamento/. Acesso em: 20 maio 2021.